Desenvolvimento urbano sustentável: instrumentos políticos na gestão ambiental

Desenvolvimento urbano sustentável: instrumentos políticos na gestão ambiental

Durante muito tempo, a busca constante dos países desenvolvidos por altos níveis de desenvolvimento econômico, com acesso irrestrito aos recursos naturais, resultou em efeitos  negativos ao ambiente, tais como a poluição da água e do ar, resíduos perigosos e, mais recentemente, a mudança climática global. Nesse contexto, a gestão ambiental sempre foi vista como uma restrição necessária ou uma regulação da atividade econômica para conter os danos ambientais dentro de limites aceitáveis. A política de gestão ambiental era independente da política econômica e do desenvolvimento sustentável e suas ações se concentravam em proteger o meio ambiente e  a qualidade de vida,  dos efeitos secundários da atividade econômica. Em geral, as intervenções ambientais não eram percebidas como atividades produtivas, mas como uma quebra da atividade econômica. Esta perceção ocorre pela falha em reconhecer as ligações entre a proteção ambiental, a eficiência, a sustentabilidade do desenvolvimento, a reestruturação de processos e, em parte, o tipo dominante de instrumentos de política utilizados para implementar a gestão ambiental. Na atualidade,  os conceitos de desenvolvimento sustentável e de coesão econômica mudaram o panorama da gestão ambiental em termos de objetivos e formas de governar. A perceção da política do ambiente mudou de uma responsabilidade econômica para uma potencial vantagem econômica.  E muitas atenções voltam-se para as implicações do desenvolvimento sustentável no contexto urbano, considerando as interrelações entre as dimensões econômica, social e ambiental. A busca pela sustentablidade urbana e por cidades melhores para se viver  tem sido uma preocupação constante de alguns governos que consideram socialmente benéfico internalizar os benefícios sociais de atividades que geram externalidades positivas. É o caso dos investimentos em qualidade ambiental, integração sócio-cultural, mobilidade urbana sustentável, entre outras atividades  que promovem a qualidade de vida  e o bem estar da população. É concenso que as áreas urbanas constituem  importantes locais para o desenvolvimento econômico e social de um país, e o tema “sustentabilidade” adquiriu importância significativa  com o evidente crescimento das áreas urbanas no mundo. O interesse por esse assunto é atribuído a publicação de 1987 do relatório da Comissão Brundland denominado Our Common Future, mas a temática sobre o ambiente urbano, revelou‐se mais presente quando também fez parte do programa dedicado ao Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Conferência do Rio/92 . Desse encontro nasceu a Agenda 21, com discussões de importantes medidas rumo ao desenvolvimento sustentável. Em um de seus capítulos, o documento sugere a transferência das suas medidas para o nível local – a Agenda 21 Local, através de um processo participativo em que as próprias populações, sabendo quais as suas realidades locais, obtenham consenso sobre os melhores modelos de desenvolvimento.

Desenvolvimento Urbano

O ambiente urbano é formado por dois sistemas intimamente interrelacionados: o “sistema natural” composto do meio físico e biológico (solo, vegetação, animais, água, etc) e o “sistema antrópico” consistindo do homem e de suas atividades, de forma que o ambiente urbano interage com o ambiente natural e os reflexos das atividades humanas podem ser vistos em ambos. O “modo de vida urbano” expressa-se sobretudo pelas relações sociais que se estabelecem nesse espaço, decorrentes de uma aproximação físico-territorial e de um sistema cultural. O processo de urbanização é uma realidade constatada mundialmente. Este processo tem sido intenso, modificando rapidamente a dinâmica das cidades, exigindo um planeamento sustentável e a compreensão das suas relações e impactos locais e globais. A globalização e a consequente  reestruturação econômica das últimas décadas têm afetado de várias formas o desenvolvimento urbano de países desenvolvidos e em desenvolvimento, embora a forma de impacto tem sido fortemente determinada por fatores políticos locais. Enquanto as regiões mais desenvolvidas apresentam um panorama estabilizado quanto ao crescimento de áreas urbanas, as regiões em desenvolvimento tendem a aumentar cada vez o número de pessoas nessas áreas . A percepção das peculiaridades de cada local ao qual o processo de desenvolvimento urbano deve adaptar-se apresenta grandes dasafios, visto que implica no envolvimento efetivo de diferentes agentes, sejam eles, governantes, grupos econômicos ou cidadãos. A sustentabilidade urbana apresenta três aspectos diferentes:
  1. A contribuição das atividades das áreas urbanas para um resultado insustentável;
  2. As possibilidades de uso das áreas urbanas para tornar o desenvolvimento econômico mais sustentável;
  3. As propostas de governo, em nível urbano, que influenciam ações para a sustentabilidade e demonstram compromissos com a agenda de desenvolvimento sustentável .
Todavia, a busca por um bem estar sustentável para futuras gerações  implica em três importantes dimensões:
  • a existência de um nível positivo de bem estar sustentável;
  • a magnitude das metas de bem estar futuros  frente aos níveis de bem estar atuais;
  • a capacidade de entendimento pelas gerações anteriores dos níveis futuros de bem estar.

 Gestão do ambiente e economia 

O debate de questões ambientais tem crescido muito nos últimos tempos. As  discussões saem da esfera política e acabam por envolver diferentes agentes, nomeadamente associações de defesa do ambiente, grupos econômicos e cidadãos em geral. O interesse na discussão ambiental manifesta-se desde a escala local até global, e relaciona política do ambiente, desenvolvimento econômico e vida social. No contexto econômico atual, diante de muitas restrições orçamentárias e de fragilidades institucionais, os  governantes precisam decidir quais problemas são prioritários e, muitas vezes torna-se difícil atingir os níveis necessários de proteção ambiental. Nesse sentido,  as análises econômicas vêm conquistando uma atenção cada vez maior, à medida que possibilitam avaliar os custos impostos à sociedade. A evolução das políticas ambientais desde o início dos anos 1970 tem se caracterizado por duas situações: em primeiro lugar o desenvolvimento de um número de “princípios” concebidos para dar base a estas políticas, tanto em nível empresarial quanto aqueles reconhecidos internacionalmente: o princípio do “poluidor-pagador” é o mais importante. Em segundo lugar, o desenvolvimento e a implantação dos chamados “instrumentos de política”, projetados para implementar e aplicar políticas ambientais. O princípio de internalização das externalidades através do pagamento do imposto pigouveano (poluidor-pagador)  embasa boa parte do senso comum quanto à forma como o Estado deve gerir a questão da degradação ambiental. Porém outros métodos de valoração monetária dos recursos naturais foram  criados ou adaptados pelos integrantes da escola ambiental neoclássica, como o Teorema de Coase que analisa o problema de valoração das externalidades como consequência da ausência de propriedade particular sobre os recursos naturais, ou ainda a aplicação da análise custo/benefício e de valoração contingencial para as externalidades ambientais, todos sob a ótica da internalização das externalidades ambientais. Por outro lado, a formulação de metas e objetivos ambientais é um processo de construção de consenso e isso requer a consulta aos agentes interessados, além da avaliação da viabilidade administrativa e financeira de forma a atingir os resultados desejados em termos de qualidade e controlo do ambiente.

O uso de instrumentos políticos para a regulação ambiental

Instrumentos de política ambiental são ferramentas utilizadas pelos governos para implementar as suas políticas ambientais. Muitos tipos de instrumentos políticos, com grau variável de sucesso, têm sido usados por vários governos em decisões relativas à questão ambiental. Esses instrumentos podem ser divididos em dois principais tipos: i) instrumentos reguladores, ou instrumentos do tipo comando e controle, onde o poder público estabelece os padrões e monitora a qualidade ambiental, regulando as atividades e aplicando sanções e penalidades, via legislação e normas; e ii) instrumentos econômicos ou instrumentos de mercado, tais como impostos e isenções fiscais, licenças negociáveis​​ e taxas. Algumas medidas voluntárias, como os acordos bilaterais negociados entre o governo e empresas privadas, e os compromissos assumidos por empresas independentes da pressão do governo, são outros instrumentos utilizados na política ambiental. Da mesma forma, medidas como a ampla divulgação ao público, a informação e a educação também vêm sendo cada vez mais usados. De acordo com a UNEP (Programa Ambiental das Nações Unidas), ao longo dos últimos anos cresceu o interesse no uso dos mecanismos de mercado para atingir os objetivos de proteção ambiental. Ao invés dos governos estipularem as tecnologias que devem ser utilizadas para reduzir os danos ambientais ou definir a intervenção máxima sobre os recursos naturais, processo esse conhecido como “comando e controle”, o uso de instrumentos econômicos pode fornecer um incentivo  financeiro aos agentes agressores do ambiente de modo a modificar seus comportamentos.

Instrumentos de Regulação e Controle

Instrumentos de regulação são utilizados na maioria dos países. Eles podem ser definidos como regras institucionais que visam a influenciar diretamente o desempenho ambiental dos poluidores, regulamentando os processos e produtos utilizados, proibindo ou limitando a descarga de certos poluentes, e/ou restringindo as atividades a certos períodos ou áreas. Os maiores problemas para sua adoção são a falta de reforço e o efeito rebote; por outro lado, a maioria das medidas políticas atinge altas economias a baixo custo, geralmente a custos negativos para a sociedade e por isso, geralmente são combinados com outros instrumentos.

Instrumentos econômicos ou de mercado

Instrumentos econômicos são baseados nos mecanismos de mercado, e geralmente contêm elementos de ação voluntária ou participação, que muitas vezes são iniciadas ou promovidas por regulamentações de incentivo. Os instrumentos econômicos podem ajudar em questões sobre a eficiência e a flexibilidade da regulamentação existente, além de responder a necessidade de receitas fiscais na busca de instrumentos para reconciliar a política econômica e ambiental e promover o desenvolvimento sustentável. Em muitos casos, a introdução gradual de uma selecção de instrumentos econômicos adaptados às condições locais, pode dar flexibilidade, apoio financeiro, e maior eficiência aos regimes regulamentares existentes. Os incentivos fiscais podem ser  ferramentas de políticas públicas que influenciam os preços a partir do uso de medidas fiscais, de modo a promover incentivos financeiros que podem alterar comportamentos. Tanto podem reduzir o consumo de um determinado bem ou serviço ao aplicar um imposto ou incentivá-lo por meio de suporte financeiro, se forem consideradas as barreiras relacionadas com o custo inicial.

Instrumentos de informação e persuasão

Essa categoria reagrupa uma série de medidas políticas muito diferentes, cuja eficiência depende, entre outros fatores, de uma combinação apropriada com outras políticas públicas. Apesar de serem consideradas medidas pouco rígidas, podem atingir economias significativas. Utilizam a oferta de informação e o uso de discursos significativos para persuadir pessoas e organizações no sentido de promover ações voluntárias a favor do ambiente. No que tange especificamente a governança para o desenvolvimento urbano sustentável, Rydin( 2010, p. 56) sintetiza na Tabela 1 as ações necessárias relacionadas às políticas ambientais de modo a superar possíveis resistências. Tabela 1: Ações necessárias para superar resistências
Instrumentos Políticos Construção da vontade de agir Construção da capacidade de agir Resistencia contrária de agentes individuais ou grupos Mudança de estruturas de incentivo
Informação e persuasão Mudar a percepção dos agentes sobre as razões para agir Mostrar que mudanças são possíveis Informações contrárias as fornecidas pelos agentes, minimizar a legitimidade de seus comportamentos Conhecimento é poder
Incentivos financeiros Promover o incentivo a ação Promover recursos financeiros para ações Reestruturar os recursos disponíveis a alguns agentes e quem sabe reduzir seu poder Reestruturar estruturas de incentivo
Ações colaborativas Criando  redes de contatos a fim de criar uma agenda para ação Rever recursos a partir das redes de contatos Controlar  agentes por meio de sansões leves e sobrepor conflitos Alterar as relações estabelecidas entre os agentes e a percepção dos incentivos
Regulação e controlo Elevar  expectativas sobre normas e potenciais benefícios Estabelecer estratégias para atingir os resultados Controlar o comportamento dos agentes através de ações regulatórias Alterar o balanço de custos e benefícios a partir das normas estabelecidas

A escolha da melhor opção

Promover a cidade do futuro é uma tarefa dura! Contemplar de uma forma equilibrada os  princípios de sustentabilidade exige ações de envolvimento coletivo. A participação de todos os agentes da sociedade, sejam eles governantes, corpo científico, grupos econômicos e cidadãos em geral é essencial para se conhecer as necessidades de uma comunidade e principalmente, dar legitimidade a todas as ações realizadas, o que torna o processo mais fácil de se consolidar. Na atualidade, muito se tem discutido sobre as formas de governar e os mecanismos necessários para colocar determinadas políticas em prática. A evolução das políticas ambientais nas últimas décadas valeu-se cada vez mais de instrumentos econômicos para tornar–se mais eficiente.  De alguma forma, percebe-se que a melhoria das condições de vida dos cidadãos em áreas urbanas depende de decisões políticas, cujos recursos podem ser originados não apenas de investimentos públicos, mas também da responsabilidade privada pelos danos que determinadas atividades provocam no ambiente. E não existe uma fórmula mágica para se atingir os objetivos de qualquer ação. É necessário entender as características de cada local e tomar medidas coerentes com as necessidades identificadas  e  com a capacidade de resposta da comunidade. Cada vez mais, percebe-se que uma única medida não é suficiente e a perspicácia de governantes no uso da melhor combinação de instrumentos políticos pode fazer a diferença entre o sucesso e o fracasso de uma política. Por outro lado, qualquer política não é estanque em si. Todos os processos precisam ser avaliados em diferentes fases, desde sua elaboração até consolidação, e sempre que se identificar necessidade de ajustes para corrigir algumas distorções, devem ser realizadas.  Os decisores políticos devem ser os maestros nesse processo.
Planejamento urbano como importante fator para a adaptação das cidades às mudanças climáticas

Planejamento urbano como importante fator para a adaptação das cidades às mudanças climáticas

Nos últimos anos, as mudanças climáticas geraram grandes debates em torno das questões ambientais. Apesar de muitas incertezas, existe um consenso científico de que, desde o início da era industrial, as atividades humanas têm sido diretamente responsáveis por essas mudanças. Por isso, devido a alta concentração de pessoas, infraestruturas e atividades, as áreas urbanas são consideradas potenciais indutores das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, áreas particularmente vulneráveis aos efeitos dessas mudanças.

São muitos os impactos previstos para as próximas décadas em áreas urbanas: o aumento acentuado de temperatura devido a conjugação dos efeitos das mudanças climáticas com a ilha de calor urbana; o aumento dos riscos associados a precipitações intensas, como cheias e inundações; a diminuição das precipitações médias e o consequente comprometimento do abastecimento de água; nas áreas costeiras, o aumento de tempestades e a subida do nível do mar provocando inundações e até a submersão de bairros litorâneos; o aumento da poluição atmosférica provocada pelo incremento de fluxos radioativos, pelo tráfego intenso de automóveis e pelas atividades industriais; a diminuição da qualidade da água devido à diminuição dos caudais e ao aumento dos efluentes líquidos e gasosos, além dos resíduos sólidos; e por fim, o aumento da intensidade e frequência de ondas de calor.

Esse panorama faz emergir a necessidade de mudanças no contexto do planejamento urbano nas diferentes regiões do planeta. Surgem novas prioridades, reforçando a dimensão ambiental do ordenamento do território e o estabelecimento de uma nova lógica de coordenação das ações e de integração de políticas com diferentes prioridades.

As mudanças climáticas são uma ameaça particular a regiões com alta concentração populacional e com atividades econômicas baseadas em estruturas ambientais frágeis e vulneráveis, como é o caso de regiões costeiras, foz de rios e áreas baixas. As maiores implicações para essas áreas podem ser estruturadas em três categorias distintas, fortemente inter-relacionadas:

  • Ambiental: Alterações nos sistemas marinhos e costeiros, cobertura florestal e biodiversidade;
  • Econômica: Ameaça à segurança da água, impactos na agricultura e pesca, interrupção do turismo e redução da segurança energética – situações que podem ter um impacto negativo na economia;
  • Social: perdas dos meios de subsistência de comunidades, aumento de problemas de saúde, e deslocamento de populações em busca de novos locais para viver.

No que se refere às características físicas do espaço urbano, os fatores determinantes dos impactos de um evento climático extremo são o uso do solo e a morfologia da área de vizinhança que inclui as habitações e o espaço para interações sociais e econômicas. A forma e a distribuição dessas estruturas (dispersa ou concentrada) criam uma realidade física particular que pode induzir os comportamentos com um impacto significativo sobre o desempenho ambiental de um determinado lugar.

No caso das áreas urbanizadas, o aumento de temperatura, assim como a alteração nos regimes de ventos e outras variáveis do meio biofísico, exercem uma significativa alteração nos volumes e distribuição das chuvas, concentrando as precipitações atmosféricas em algumas regiões e tornando-as escassas em outras. Evaporação, temperatura e precipitação são importantes parâmetros climáticos. Ao mesmo tempo em que a temperatura global e regional está a aumentar, a evaporação da água da superfície e do solo também aumenta. Normalmente, mais evaporação representa mais vapor de água na atmosfera e consequentemente, mais precipitação.

Assim, uma redistribuição nos regimes pluviométricos pode trazer consequências sérias para a vida da população, principalmente, sobre a população urbana. A gestão das grandes chuvadas é um desafio para qualquer área populacional. À medida que as cidades se desenvolvem, as superfícies impermeáveis cada vez maiores contribuem para a alteração da qualidade e quantidade da drenagem das águas. Infraestruturas e áreas construídas podem modificar consideravelmente a superfície do solo e, causar stress ao ecossistema pela modificação do equilíbrio hidrológico, e pela contaminação da água e dos solos.

Com vistas a enfrentar esses problemas, muitas cidades tem desenvolvido políticas de adaptação às mudanças climáticas. Na maior parte dos casos, o planejamento urbano constitui-se em um recurso essencial para promover uma forma de urbanização mais adequada e, até mesmo deslocar determinadas atividades das áreas de risco.

Adaptação às Mudanças Climáticas

Adaptação é o ajuste nos sistemas naturais ou humanos em resposta aos estímulos climáticos atuais ou estimados,  ou seus efeitos, de modo a controlar danos ou explorar as boas oportunidades. Sendo assim, pode-se entender que as estratégias de adaptação devem abordar causas e inevitáveis consequências das mudanças climáticas.

No planeamento urbano, a adaptação deve ser um processo sistemático e cíclico que envolve algumas etapas básicas:

  • Avaliação de riscos e de vulnerabilidades às mudanças climáticas;
  • Identificação de opções de adaptação;
  • Avaliação das opções de adaptação;
  • Implementação;
  • Monitorização e avaliação das ações de adaptação

Os atores envolvidos na adaptação abrangem uma larga gama de interesses setoriais. Dessa forma, o desenvolvimento de estratégias de adaptação em sistemas urbanos torna-se um processo extremamente complexo e desafiador. Muitos atores são obrigados a trabalhar de forma colaborativa, bem como de forma independente.

O sucesso do planejamento e da implementação de estratégias de adaptação depende de vários fatores tais como: ações de sensibilização, orientadas para os diferentes agentes envolvidos, além do envolvimento de diferentes setores e escalas políticas; soluções que proporcionam benefícios adicionais, para que sejam bem aceitas pela comunidade e mais facilmente implementadas; e por fim, o trabalho com a natureza, em vez de trabalhar contra os processos naturais.

O ordenamento de território exerce um papel fundamental nesse contexto, pois aborda tanto as causas como as inevitáveis consequências das mudanças climáticas. Para tanto, deve envolver o planejamento ambiental no novo enquadramento das intervenções espaciais, com um enfoque de longo prazo e com especial atenção às relações entre as novas formas construídas e as existentes.

A mudança climática afeta os diferentes aspectos de ordenamento do território e do ambiente construído, incluindo as estruturas externas dos edifícios, os ambientes internos, a infra-estrutura de serviços (drenagem, água, resíduos, energia, transportes e telecomunicações), os espaços abertos, o conforto humano, e a forma como as pessoas usam o espaço interior e exterior.

Integrar as mudanças climáticas nos códigos de construção e de ordenamento do território torna-se imperativo, pois o ambiente construído tem longo tempo de vida e alto custo. Novas intervenções devem ser concebidas para lidar com o futuro e incluir na paisagem urbana, espaços abertos e corredores de transporte que levam em consideração as previsões de aumento temperaturas, de mudança dos padrões de chuvas, e do aumento do nível do mar em algumas décadas.

Por que precisamos falar urgentemente em Resiliência?

Por que precisamos falar urgentemente em Resiliência?

Você sabe o que significa resiliência? O que esse termo tem a ver com a greve dos caminhoneiros? Que lições podemos tirar dessa crise para a construção da resiliência às mudanças climáticas?

Uma greve de caminhoneiros provocou essa semana, uma crise de abastecimento em todo o país e a consequente interrupção de serviços urbanos básicos, tais como transporte público, recolha de lixo, abastecimento de água, de gás e a oferta de serviços de saúde, entre outros.

A luz vermelha se acendeu!! Até que ponto nossas cidades são resilientes a uma crise que, por ventura, possa ser provocada por algum evento climático extremo?

Em geral, a resiliência é entendida como a capacidade de um determinado sistema para recuperar o seu equilíbrio depois de ter sofrido uma perturbação. Mas essa descrição um tanto reducionista não se aplica a um sistema complexo como uma cidade, exposta a uma grande diversidade de riscos. Podemos chamar de cidades resilientes aquelas preparadas para absorver e se recuperar de qualquer tipo de choque ou estresse, mantendo suas funções e estruturas essenciais e sua identidade, e que se mostrem capazes de se adaptar e enfrentar possíveis mudanças. Mas a resiliência urbana é uma característica construída ao longo do desenvolvimento e do crescimento urbano. Para tanto, é necessário um planejamento urbano estratégico e sustentável, que leve em consideração alguns princípios fundamentais de resiliência.

A experiência dessa semana mostrou a grande fragilidade dos nossos sistemas urbanos cujo  abastecimento de bens e insumos é suportado apenas pelo transporte rodoviário.  Essa situação rompe com o princípio essencial da resiliência: Manter a diversidade e a redundância. Esse princípio defende que sistemas com muitos componentes diferentes (no caso, outros tipos de transporte de cargas como o ferroviário, fluvial, marítimo e aéreo) são geralmente mais resilientes do que um sistema com poucos componentes (situação do Brasil). Além disso, a redundância (disponibilidade do recurso superior à sua necessidade) garante a segurança dentro de um sistema, permitindo que alguns componentes compensem a perda ou a falha de outros. Vale aquele ditado: “não coloque todos os ovos na mesma cesta”.

Mas no caso específico da greve dos transportes de cargas, ainda temos outro aspecto agravante: a dependência dos combustíveis fósseis, especificamente o óleo diesel. No Brasil, tanto os transportes de carga, quanto os transportes públicos e de particulares seguem a mesma matriz energética focada no petróleo. E esse produto também é distribuído por rodovias. Essa situação nos coloca à mercê de muitas variáveis que podem ser afetadas em uma crise, tais como a disponibilidade do produto (seja por produção própria ou importação), a capacidade de distribuição e abastecimento,  e a variabilidade dos preços em função das políticas adotadas. Aliás, essa semana ficou claro o equívoco estratégico das políticas de transporte que tem sido adotadas há décadas segidas tanto em nível nacional, quanto local.

Se fizermos um contraponto do que ocorreu essa semana,  avaliando a nossa capacidade de resiliência à uma crise de abastecimento e relacionarmos com os possíveis impactos associados à mudança climática, fica evidente a necessidade de repensarmos as dinâmicas urbanas de nossas cidadesE a questão do transporte é crucial em um contexto de mudanças climáticas.

Os transportes representam uma parcela significativa (14%) na emissão de gases de efeito estufa que provocam o aquecimento global e ao mesmo tempo, constituem um setor estratégico no caso de perturbações provocadas por eventos climáticos extremos. Sendo assim, é fundamental  uma atenção especial às políticas públicas que definem a estrutura modal de transportes e a matriz energética que movem o país e as cidades. E prá isso, além da demanda por investimento financeiro, é essencial a vontade política de mudar, o que no Brasil, pode ser a tarefa mais complexa.

Vale aqui listar algumas medidas sustentáveis adotadas em muitos países que podem servir de inspiração para a nossa mudança: o investimento em ciclovias, a diversificação  de meios de transporte, como o uso de trens, metrôs e barcos,  a ampliação da rede de transporte público, o incentivo à implementação de veículos elétricos e movidos a biocombustíveis e o financiamento de pesquisas em novas tecnologias para transportes e combustíveis.

  • Foto: Pablo Jacob / Agencia O Globo